Ana Carolina Machado

"Importante observarmos que, a preexistência de um programa de integridade não é condição sine qua non para que haja a redução da penalidade aplicável, mas sim, o compromisso com sua implementação futura para a celebração do acordo, ou seja, a leniência torna-se a causa da instituição de um programa de integridade e o programa, por sua vez, uma consequência da negociação", trecho do artigo VIAETICA - O fomento à integridade sob a ótica do acordo de leniência escrito por Ana Carolina Mazzer - Coordenadora-Geral de Integridade do Ministerio da Agricultura.


Após a edição da Lei Anticorrupção, sancionada em 2013, e a crise institucional que se instalou no país, a partir das investigações que desencadearam em um grande número de escândalos de corrupção, o fomento à integridade pública-privada tomou espaço nas discussões entre os envolvidos no tema.

Diante disso, o Decreto nº 8.420/2015, que regulamentou a Lei Anticorrupção, passou a prever a celebração do acordo de leniência anticorrupção entre a Controladoria-Geral da União (CGU), e as empresas investigadas pela prática de atos lesivos contra a Administração Pública.

A partir da responsabilização administrativa e civil que passou a dispor quanto às pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou internacional, tornou-se latente o movimento por maior integridade no relacionamento entre as empresas e o setor público, havendo, no próprio texto legal, o incentivo para a instituição de programas de integridade por parte das empresas como um dos fatores a ser considerado na dosimetria da sanção administrativa aplicada.

Importante observarmos que, a preexistência de um programa de integridade não é condição sine qua non para que haja a redução da penalidade aplicável, mas sim, o compromisso com sua implementação futura para a celebração do acordo, ou seja, a leniência torna-se a causa da instituição de um programa de integridade e o programa, por sua vez, uma consequência da negociação.

Posto isso, é possível concluir que foi outorgada” ao Estado, a competência não só de garantir com que as empresas assumam as responsabilidades estabelecidas a fim de reparar o dano causado e contribuam com as investigações, mas também pelo compromisso com a integridade, considerando seu latente potencial de fomento às políticas públicas, na criação de incentivos à integridade privada-pública e ao desenvolvimento de mecanismos internos de averiguação e controle de irregularidades.

Os mais pessimistas afirmam que, a implementação de um programa de integridade, após o cometimento do ilícito é uma solução de curto prazo que induz o comportamento empresarial e se torna consequência de incentivos públicos, sem que haja o efetivo comprometimento da alta direção, seguindo na contramão do autocontrole e da efetiva mudança de cultura.

Mas o cenário pode ser melhor e mais próspero se olharmos sob outra perspectiva. O que acontece com o funcionário de uma empresa que pratica um ato ilícito, tendo ao seu redor” um programa de integridade onde é possível identificar os principais riscos a ilícitos e instituir mecanismos eficazes para se prevenir riscos futuros de práticas indevidas?

A resposta é tão simples quanto parece, nesse caso, além de identificar os funcionários ou dirigentes que praticaram o ilícito, a empresa pode decidir interromper sua participação, lançar mão de medidas mitigadoras que impeçam a recorrência do ato  e, tão logo, iniciar as negociações com as autoridades competentes para a celebração do acordo de leniência. Dessa forma, inicia-se um próspero caminho para reconciliar-se com o passado e encontrar novas formas de olhar para frente e superar a pauta da corrupção.

Consciente dessa responsabilidade, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), instituiu um selo setorial denominado Selo Mais Integridade, com o objetivo de reconhecer e premiar empresas e cooperativas agropecuárias que reconhecidamente adotem boas práticas de integridade, ética, responsabilidade social e sustentabilidade ambiental.

O objetivo, sobretudo, é fomentar a adequação das práticas internas das empresas e cooperativas aos pilares de integridade e garantir uma efetiva mudança na postura e na cultura de seus colaborares e dirigentes. A avaliação, para fins de recebimento da premiação consiste em um formulário dividido sob três enfoques: (i) anticorrupção; (ii) trabalhista e de (iii) sustentabilidade.

Ainda que não haja a promessa de privilégio a ser concedido pelo MAPA às empresas e cooperativas premiadas, os benefícios são óbvios. Primeiro, há a questão da segurança de ter um programa avaliado pelo próprio governo, uma espécie de auditoria externa gratuita”, mas, além disso, existem também a publicidade, o reconhecimento e, por que não, o aumento do próprio valor concorrencial da empresa perante o mercado e incentivando o setor a adotar os mesmos parâmetros, pois eles não se exaurem no âmbito individual.

Segundo que, para além dos limites do Selo, um possível acordo de leniência trazido a partir do programa de integridade, ou seja, como consequência de uma auto-declaração voluntária da empresa, gera maior legitimidade na construção da moralidade e cultura de respeito à legalidade.

Assim, o que poderia ser considerado uma falha no programa de integridade, sob a perspectiva da necessidade de celebração do acordo de leniência, é na verdade, uma boa oportunidade para rever diretrizes e promover a formatação mais adequada na estruturação interna das empresas, antecipando os problemas de maneira efetiva e impedindo ou minimizando os efeitos deles decorrentes, antes que sejam irreversíveis.

 Importante consignar que, não estamos falando de um colete anticorrupção” perpétuo, mas sim, de uma permanente vigilância. A era da reconciliação entre os setores público e privado, chegou, e ambos precisam sentar-se à mesma mesa e compartilhar responsabilidades, enquanto desenvolvem a economia do país, cumprem sua função social e tornam-se parceiros confiáveis.

Saiba mais em https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/integridade

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